No último semestre, a juventude brasileira mostrou estar na linha
de frente da luta pela Memória, Verdade e Justiça em nosso país. Tomando
as ruas com seus escrachos e protestos, não apenas fez frente
às manifestações reacionárias de setores midiáticos e militares que ladravam
contra a Verdade e a Memória: foi fundamental para acelerar o processo de
instalação da Comissão Nacional da Verdade. Tendo nascido anos após o fim
do período de autoritarismo, essa geração se move por entender o quanto resta
da Ditadura em nosso país ainda hoje: na desigualdade estrutural de nossa
sociedade, no silêncio conservador da mídia, na arbitrariedade da Polícia
Militar, na constante criminalização da luta política.
Nas Universidades não é tanto diferente. Para além de todos
obstáculos impostos cotidianamente, que dificultam aos estudantes que se
organizem e mobilizem, a própria estrutura de nossas Universidades leva as
marcas da Reforma Universitária autoritária de 1968. Ainda que nos últimos
anos o processo de expansão de vagas nas Universidades Públicas tenha
transformado sua composição social, nosso modelo de ensino superior ainda é
profundamente tecnicista, mercadológico e profissionalizante. Com pouca ênfase
na pesquisa e na extensão universitária, o processo pedagógico aplicado no
Brasil hoje sobrecarrega o estudante de aulas expositivas que pouco dialogam
entre si ou abrem espaço à reflexão crítica. A Universidade trata o
ensino como um processo industrial, onde se busca ejetar as universitárias e
universitários o mais rápido possível para o mercado de trabalho. Dentro
desse paradigma meritocrático e sufocante de ensino superior, questões como a
interdisciplinariedade, o debate político e a gestão democrática do ensino são
consideradas perda de tempo, um desvio de atenção do real objetivo e papel da
Universidade – a mera formação de mão de obra qualificada.
Enquanto movimento eminentemente jovem e crítico, o movimento
estudantil deve conseguir entender como aproveitar o momento histórico que vive
o Brasil para reabrir a luta por uma Universidade diferente, mais democrática,
popular e emancipatória. E, muito nesse sentido, deve entender a quem vem a
Comissão Nacional da Verdade.
Como as Comissões da Verdade de diversos outros países, a nossa
deverá investigar os crimes cometidos pelos golpistas na implementação de seu
projeto elitista de país e recomendar reformas do aparelho estatal brasileiro
que visem torná-lo mais democrático. Tendo o Estado brasileiro sido democratizado
em um processo sem rupturas, onde as rédeas da abertura política seguiram por
anos nas mãos de agentes da Ditadura, em muito das relações entre a
Sociedade e o Estado permanecem desvios autoritários. Um exemplo sempre muito
evidente é o da falta de participação dos movimentos sociais nas tomadas de
decisão dos Parlamentos e Governos, ou mesmo a repressão policial a que estão
constantemente submetidos. Incontáveis são as greves que, no Brasil, são
condenadas na Justiça como “ilegais”.
É fundamental que, em nossa atuação no movimento estudantil,
lembremos que um dos motivos por trás do golpe militar de 1964 foi interromper
a luta da União Nacional dos Estudantes e dos movimentos populares por uma
Reforma Universitária que buscasse ampliar o acesso à Universidade Pública,
gratuita e transformadora, e exigir que tal debate esteja na base da
compreensão do significado político da Ditadura Civil-Militar.
Para tanto, é preciso que os e as estudantes debatam profundamente
a importância da Comissão da Verdade, do resgate da Memória e da luta pela
punição dos golpistas. Em diversos países do mundo, estudantes
universitários contribuíram (através de grupos de pesquisa, estudos e debate)
com os trabalhos das Comissões da Verdade, apontando sentidos para suas
investigações e ajudando a divulgar para a sociedade os avanços obtidos por
tais Comissões, pressionando-as sempre que necessário.
Protagonista no processo de luta que se desenrola a partir da nomeação
da Comissão da Verdade, a Juventude deve pautar seus rumos e prioridades. Está
nas mãos desta geração levar adiante a busca interrompida por uma Universidade
Pública para todas e todos, capaz de formar crítica e humanisticamente e de
estar à serviço da construção de um Brasil mais popular e igualitário.
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